terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Macumba existe?

Pensei em ligar, acordei de um pesadelo bem estranho, são cinco e meia da manhã e a cama está com cacos de vidro, e meus instintos já me disseram do que se trata, quase como uma certeza de bicho quando é encurralado, então ele pensa, sim eles pensam, de um modo ou de outro eles percebem que ou serão devorados, ou terão que atacar.
Pois bem, deve ser essa a sensação que está tentando sufocar o peito, e a macumba que alguém fez vai ter que sair de casa agora.Me lembro da última macumba que fizeram para mim, a volta foi tão forte que passei a acreditar mais em alguma possibilidade de existir.Naquela ocasião um de meus olhos ficaram em sangue, derramado entre os espaços da córnea, e assim permaceceu, cortado, durante uma semana.Mas a macumba voltou, sem que eu fizesse nada, e o marido de quem encomendou, ou executou a macumba, até hoje não sei ao certo se isso faz alguma diferença, teve um infarte, e lá estava eu arranjando os melhores médicos para o homem.

Hoje a coisa foi diferente, dormia, após assistir Godspell e em sonhos me teletransportei para dentro do musical.

O nosso grupo viajava em um ônibus grande.Era uma diversidade de pessoas, de todas as idades, o mais novo, Demétrio, sentado ao lado do pai. Aos três anos, tinha voz grave e impostada demais para a idade.Estavámos a caminho de um show, na TV passavam as músicas do conjunto, era uma espécie de concurso, ou processo seletivo para fazer parte desse musical.
Estávamos todos no ônibus, crianças, velhos, jovens cantores e Vivian, ao meu lado, uma menina de nove anos, esperta, morena em longos cabelos negros, de um olhar denso que escondia uma tristeza funda e uma dúvida, dessas que vivem numa variante X ou Y.
Paramos no local do show, todos desceram lentamente, e aos poucos a quantidade de pessoas aumentava, o que trazia um estado constante de atenção para não perder as crianças em meio a multidão.

Sabia que estavas lá, talvez fosse o acerto de contas, se é que poderia chamar assim o encontro de duas almas que mal se conhecem e se amam tanto.
- Nossa você era mais alto antes de eu desmistificar o que aconteceu com a gente.
Ela é covarde dizia uma das moçoilas que dançavam ao seu lado.
E ele, ele estava lindo, assim que começaram a cantar e apresentar a canção, somente a voz e a percurssão de seu corpo entravam pelos meus ouvidos. O Frances estava falando português e ao fim do show, beijo sua mão, te dizendo nos nossos corações para ir embora, em paz, sem maiores cortes e cicatrizes, sem uma palavra, apenas o doce olhar de quem ama demasiadamente o seu espírito.Foi um beijo nas mãos, nos olhos, ficamos testa com testa nos perdoando e aceitando que tínhamos que seguir em frente.Funcionou, fui embora, subi as ladeiras de terra molhada, sem olhar para tras. Sete passos a frente, relaxados, e o caminhar se trornou estranho, tão inexplicável quanto os cacos de vidro que estão em minha cama agora, na palma das minhas mãos. Desci correndo para ver se te avistava, o resto do ambiente estava escuro e as pessoas que estavam no ônibus, caminhavam todas em direção contrária, subindo, procurando suas novas casas ou então voltando para o ônibus querendo seguir em frente, rumo ao sonho do musical.

Mas eu voltei, você estava entre um pequeno espaço de meus olhos, e como eu tinha um jeito de disfarçar que te via, fiz isso, te vi, pela última vez do jeito que criei, naquele momento quis ir embora, virei e ouvi seus olhos nas minhas costas, os mesmos olhos doces e diretos e o alvoroço das moçoilas não entendendo como eu poderia dar as costas.
Passamos mais uma noite juntos, falávamos a mesma língua e esse não seria mais um empecilho, não estaríamos mais perdidos nas nossas traduções.
E o sonho sem avisar mudou de cena, entrou alguém em minha casa para me acordar.

O homem que mandaram me visitar, entrou, abriu a geladeira, eu e o cão escutamos peguei um canudo de papel longo e permaneci a espera dele, claro que a minha arma não era das mais violentas, mas foi a única coisa que consegui alcançar, algo em meu corpo estava paralizado, ouvia os passos firmes de uma bota pelo corredor, eu na minha fala enrolada, como de um surdo mudo tentando falar e salvar-se, pois bem, não consegui ver a face dele, entrou no banheiro, lavava algo na pia, talvez uma faca, eu me revirei na cama e não consegui atacá-lo antes que ele o fizesse.Estava travada, agoniada, ele aparecia e se escondia, gordo, branco de cabeça raspada, bem barrigudo, parecia um daqueles chauvinistas vindo não sei de onde.
Pânico total e eu sem conseguir me mexer.

Acordei assustada, o homem ainda está aqui.Mando ir embora, ele se esconde, mas sinto a sua respiração.
Os pequeninos cacos de vidro se desfazem ao tocá-los, o ar rarefeito, a lingua dormente denucia
como a batalha foi verdadeira.Acendo um defumador e aceito que só dormirei quando ele for embora.
Não há espaço para violência mais em meus sonhos, deixem as crianças correndo pelas ladeiras e cantando nas estradas dentro de um ônibus, com seus fones de ouvido, vestidos coloridos e algumas caras emburradas diante da felicidade delas.

O sono veio novamente e se o duelo for travado, não vou fugir!

MK

domingo, 8 de fevereiro de 2009